quinta-feira, 20 de agosto de 2015

LEGADO

Hoje, por volta das dezoito e dezenove horas me deparei com as ruas de Itararé tomadas por gente correndo.
Há nove anos eu sonhava.
Era o ano de 2006, e naquela época, apenas três "loucos" corriam pela cidade. Mauro de Oliveira Lopes, Silmara Martins dos Santos, e eu.
Participávamos das provas na região e de vez em quando, sem combinar, eu encontrava com o Mauro, outro batalhador incansável, em alguma competição, como foi o caso das Maratonas de Curitiba e Florianópolis, respectivamente em 2002 e 2003.
Corria por aí e lembro de pessoas me olhando e "tirando sarro" por usar shorts curto e camisetas coloridas (da mesma forma quando usei pela primeira vez um capacete de ciclista para pedalar na cidade, quando isso ainda não se conhecia por aqui).
Corrida de rua já era febre no Brasil fazia tempo. Já distribuía camisetas e medalhas para todos. Já se usava chip eletrônico de cronometragem. Já se fazia turismo só para correr.
Mas Itararé vivia um verdadeiro marasmo no esporte.
Foi quando em agosto de 2006, quando ministrava aula de Educação Física na EE Dr. Epaminondas Ferreira Lobo para alunos do curso noturno, desenvolvi o Projeto de Desenvolvimento Curricular: "Epa! Tô na São Silvestre!
Meus objetivos colocados no projeto entregue na Secretaria de Estado da Educação: levar os alunos a adquirirem hábitos saudáveis através da prática de atividades físicas programadas, constituir uma equipe de pedestrianismo na cidade.
Meu sonho (eterno): transformar a cultura esportiva em Itararé.
Apresentei o projeto ao diretor da escola, professor Cláudio, e de pronto fui autorizado a dar início.
Começou a epopeia. Passei de classe em classe convidando alunos e professores a embarcarem comigo nessa aventura.
Na primeira sala entre algumas gozações meio veladas, cochichos, ouvi da maioria dos alunos: "- Só pode estar louco! Vai querer ganhar dos quenianos agora!" Nas outras salas a desconfiança e o descaso também foram grandes, mas vi os olhos de alguns brilharem. Houve até um que perguntou quanto ganharia se fosse o campeão da prova. E assim foi. Persisti.
Consegui trinta alunos e com eles fiz uma reunião, mostrando as camisetas e medalhas que ganhei na São Silvestre e também exibi um vídeo da transmissão da Rede Globo da edição de 2003, no qual eu aparecia segurando uma placa com o nome de Itararé.
Havia um programa na Secretaria de Estado da Educação que disponibilizava recursos para projetos de desenvolvimento curricular e era com esses recursos que eu contava para custear a ida dos alunos para São Paulo e também para inscrições, uniformes e lanches. Não seria necessário pernoitarmos lá, pois a prova ainda era realizada no período da tarde.
Mas, como sempre foi nestes nove anos, surgiu um probleminha.
O Coordenador da escola perdeu o prazo para digitar o projeto no site da Secretaria. Deram-me a notícia: - Não tem dinheiro! Cancele o projeto!
Mas nisso os alunos já haviam até iniciado os treinamentos.
Fui até o prefeito, João Fadel, de quem consegui o compromisso de fornecimento do transporte.
Com os empresários da cidade (importante mencionar os nossos primeiros patrocinadores: Do Vale Pneus, Auto Posto Estradão, Papelaria Machado, Junitex Magasin, e Faculdades Integradas de Itararé)  e consegui recursos para uniforme e inscrições. O lanche ficou por conta da escola.
Alguns alunos desistiram, mas mesmo assim fomos em treze atletas na São Silvestre, com a Equipe Epaminondas levando no peito e nas faixas o nome de Itararé.
O projeto foi um sucesso. Fomos entrevistados pela TV TEM. Tivemos destaque nos sites oficiais da Secretaria de Estado da Educação e do Governo do Estado de São Paulo, além de várias matérias nos jornais Tribuna de Itararé e O Guarani. Fomos matéria também no Jornal Folha de Itapetininga, e na mais importante revista de corridas do Brasil, a Contra-Relógio. Fomos entrevistados pela FM 94.
E veio o ano de 2007.
Ainda com o apoio da prefeitura para o transporte, percorremos a região buscando medalhas e troféus. Formamos uma equipe forte, respeitada por onde quer que passasse. Ganhamos muito. E a equipe foi crescendo. Vieram as crianças, algumas delas hoje já com famílias constituídas. Continuamos destacando Itararé e pela nossa organização acabamos incentivando e ajudando a formação de algumas outras equipe de corrida nas cidades por onde competíamos.
Treinamos pessoas que nunca haviam praticado esportes e as fizemos completar corridas de 10 km, São Silvestre, Meia Maratona e até maratonas.
Sempre convidei os empresários e diversas pessoas a participarem das corridas. Falava do que eu pretendia para a cidade, que era trazer para cá o que sempre via nas corridas: que o importante era participar. Falava que todos, independentemente da colocação na prova, eram premiados com medalhas. Mostrava as camisetas.
Mas as  pessoas sempre ficavam receosas. Incentivava, e sabia que um dia conseguiria mudar isso aqui em nossa cidade.
Começamos o Projeto São Silvestrinha, levando quatro atletas mirins na prova em São Paulo.
Os anos foram passando. Recebemos Moção de Congratulação da Câmara Municipal em 2008.
Com o crescimento da equipe, já contando com alunos de diversas escolas, optamos por mudar o nome, adotando o 28 de Agosto - 100% Itararé!
E os problemas, muitos, também foram surgindo ao longo destes nove anos. Descobrimos que existem pessoas que fazem de tudo para as coisas não darem certo na cidade. Tivemos uma época com muitos obstáculos, alguns tão absurdos, que é melhor nem comentar. E tiraram o transporte das crianças que levávamos para competir.
Não nos demos por vencidos.
O tempo mostra a verdade.
Com meu carro, dinheiro do próprio bolso e contando com o apoio de empresários (Do Vale Pneus, Auto Posto Estradão, e Junitex Magasin), continuei levando alguns atletas nas competições da região e também nas maratonas de São Paulo e Curitiba.
Continuamos bravamente destacando Itararé nas páginas de revistas, nos jornais,  nas emissoras regionais de TV de São Paulo e Paraná.
Em 2012 tive a ideia de novamente fazer um Projeto. Foi na Diretoria de Ensino - Região de Itararé.
Convidei o pessoal que trabalhava comigo para participar da prova de 10 km da Maratona de São Paulo, que ocorreu em junho daquele ano. E com a adesão de alguns iniciamos os treinos pelas estradas rurais aqui da cidade (prática comum também hoje em dia).
No dia 17 de junho de 2012, dezesseis atletas correram em São Paulo. Desses 16 eu fui o último a completar os 10 km, em 1h30. Voltaram extasiados. Cansados, é verdade, mas renovados.
E depois disso vieram muitas outras provas. São Silvestre, maratonas, treinos e mais treinos. encontros, festas juninas, trilhas, morros, cachoeiras.
O colorido laranja tomou conta das manhãs de domingo nas ruas e estradas da cidade.
Os shorts, camisetas, tênis coloridos e chamativos já não incomodam mais os olhares.
Mudamos a cultura esportiva de Itararé.
Basta olharmos os jornais de antes de nossa equipe e atualmente par ver o destaque dado para o esporte.
Outras modalidades também aprenderam com nossa equipe e começaram a divulgar suas conquistas nos jornais.
Nesses anos todos, além dos empresários que sempre me apoiaram, tive ajuda de inúmeras pessoas. Gente do bem, que pensa no outro. Que pensa no coletivo, muitas vezes em detrimento do pessoal. Impossível citar o nome de todas essas pessoas aqui. Mas fica o agradecimento.
E é isso. Um pouquinho (muito pouco mesmo) do que foi nossa trajetória nesses nove anos.
No próximo domingo teremos corrida aqui em Itararé. Duzentos atletas!
Poderia ser muito mais. Limitamos a prova para garantir a qualidade.

Vi muita gente correndo na rua hoje.
Crescemos, não?
Continuo sonhando.
Sonho alto demais.
Tem muita coisa ainda a ser melhorada. Mas já estamos no caminho
Hoje ainda temos muitos problemas.
Muitas batalhas ainda a serem enfrentadas.
Mas nossa vida é assim.
Corrida!

Professor Guilherme Gorski

Essa foi a primeira matéria com destaque para nossa equipe, na Revista Impacto Regional, de agosto de 2006.
A foto foi do primeiro treino da Equipe Epaminondas, hoje 28 de Agosto - 100% Itararé.


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